As vozes da Luta

Luiz Grabriel Lazerda




Considerando que a ópera-bufa do impeachment, coordenada a partir do lawfare neoliberal e do monopólio midiático como demanda do ajuste anti-povo, foi de fato um ~golpe de Estado~ é no mínimo estranho que setores supostamente ~pensantes~ usem como tática combater um golpe de Estado oferecendo disciplinas em universidades desse mesmo Estado (especificamente como resposta às ameaças do distópico MEC de Mendocinha e Frota à UnB), e usem como argumento a defesa de uma autonomia universitária que nunca existiu, pois as universidades públicas brasileiras sempre foram dominadas por burocratas acadêmicos e elitistas de direita e de ~esquerda~ contra as maiorias estudantis internamente e contra a abertura da universidade para o povo, no sentido real de uma universidade popular. Sem contar os inúmeros casos de convênios com as polícias militares, os esquemas de vigilância, controle, repressão e as perseguições políticas, incluindo gestões supostamente de esquerda. Qualquer discussão sobre democracia na universidade, para além da hipocrisia catedrática, deveria antes, passar necessariamente pelo debate sobre a democratização da própria universidade, sobre governo tripartite, voto universal, poder da maioria estudantil e autonomia real, não pela repetição das teses vulgares e oportunistas formuladas pela social-democracia, que vende mitos salvadores e se comporta como ala esquerda do fascismo. Quando o tema é a manutenção da hegemonia da burocracia acadêmica o método é sempre o corporativismo supra-ideológico.
Mas voltando a tese do ~golpe de Estado~, para além do desserviço da banalização conceitual, é uma caracterização sensacionalista e irresponsável, pois não houve uma ruptura institucional, pelo contrário, esse governo é a continuidade do outro, ainda mais cruel e sem a máscara populista do governo de coalização com as oligarquias, quadrilhas, latifundiários e banqueiros. O governo Temer é o governo Dilma sem dor na consciência, um governo puro-sangue da elite doentia e da burguesia pró-imperialista e anti-nacional, que descartou o PT como se coloca o lixo na esquina em dias alternados, mesmo com a demonstração de lealdade da Agenda Brasil. O paraíso das commodities obviamente chegaria ao fim, assim como a agenda das políticas compensatórias mercadejadas como distribuição de renda pelo lulismo. A brutalidade neoliberal, do Estado policial ao desemprego estrutural, corresponde exatamente a atual etapa da sanha anti-humana do capitalismo ultramonopolista, combinada ao papel de antessala do fascismo como vocação histórica da colaboração de classes.
O alarde do fim da “normalização democrática” possui um claro recorte de classe (assim como toda forma de pensamento), é próprio de um setor da pequena-burguesia localizada na esquerda institucional que insiste em legitimar pela via eleitoral um regime brutal, síntese histórica da escravidão e do regime militar-empresarial, vendido como uma democracia liberal que nunca chegou na forma de direitos à maioria negra e ao proletariado marginal, mas sempre que se fez presente foi através de massacres, do controle militar de territórios apartados sócio-racialmente e da guerra de alta intensidade contra o povo negro e pobre.
A crise da dominação burguesa no Brasil não tem qualquer desfecho previsível, a elite brasileira segue perdida numa noite suja, a única conclusão possível é que a saída ao que tudo indica será ainda mais conservadora e brutal, e mesmo não sendo parte da agenda, não é sensato descartar a possibilidade de um golpe de Estado real, principalmente se houver a confluência das demandas do capital e setores beligerantes, como a extrema-direita que opera no subterrâneo (da qual Bolsonaro é só a expressão pública e patética) e domina o aparto de todas as polícias militares no país (vide o exemplo da Scuderie Le Cocq no Espírito Santo).
O que nos resta é o trabalho militante, é organizar politicamente o ódio de um povo traído, desorganizado e entorpecido, mas que mesmo assim, instintivamente resiste. Varrer o fascismo e o reformismo é a tarefa urgente e necessária, assim como construir organismos vivos e reais de poder do povo, por fora e contra o Estado, através de uma dinâmica necessariamente comunitária e autônoma, com um programa claro e objetivo para repartir a riqueza através de uma ruptura revolucionária e construir uma nova sociedade socialista, caminho que passa por superar a esquerda pequeno-burguesa e eleitoral que habita as bolhas universitárias e os gabinetes parlamentares da cota de Estado neocolonial, organiza manifestações domesticadas, frequenta coquetéis e ganha editais, enquanto confabula traições, ementas e pirotecnias conceituais, disputando candidaturas à farsa eleitoral, ao mesmo tempo que o Estado assume abertamente sua face mais brutal e declara guerra à um povo desarmado, em todos os sentidos.
Enfim, enfia sua disciplina sobre o ~golpe~ no............

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