Autonomias para enfrentar as pandemias por Raúl Zibechi
em
26abr2020
Quando
o Estado é pouco mais que um miserável espectro genocida, os
recursos dos povos são o único remédio
possível no combate às
guerras e enfermidades, cujo efeitos não têm quase a menor
diferença entre si. É certo que as guerras destróem, além das
pessoas, os
edifícios e infraestruturas, enquanto epidemias afetam,
primordialmente, seres humanos.
No
norte e no leste da Síria, depois de uma longa década de guerra
instigada pelos principais estados do planeta e da região, os mais
armados e os menos razoáveis, capazes inclusive de ter criado e
alimentado esse monstro chamado
Estado Islâmico, os povos organizados estão
agora resistindo à
pandemia do coronavírus.
O
mais notável, de acordo com as notícias que nos chegam, é que
combatem o vírus com as mesmas armas que utilizaram diante
da guerra: a
coesão comunitária, a
organização de base e a determinação, enquanto
povos, de
enfrentar
coletivamente os
maiores obstáculos. Assim é a vida nos territórios onde o povo
Kurdo faz da autonomia sua marca de identidade.
Um respirador para cada 100 mil habitantes, estes são os recursos técnicos com que a região conta, segundo o Centro de Informação de Rojava. Boa parte do equipamento sanitário foi destruído pelos recentes ataques da Turquia às regiões autônomas Kurdas.
As cooperativas têxteis e agrícolas se encarregam de produzir máscaras para proteção e os alimentos necessários. As comunas decidiram por um toque de recolher desde 23 de março, submetendo os viajantes que chegavam a uma quarentena preventiva, porém, são as estruturas econômicas e políticas da autonomia, as mesmas que têm permitido sua sobrevivência durante uma década de guerra civil na Síria, são as que garantem a vida da população.
«As cooperativas estão mais sintonizadas com as necessidades das comunidades nas quais vivem seus integrantes e, portanto, têm mais probabilidades de tomar decisões baseadas antes nas necessidades que no lucro», assinala um repórter de «Kurdistán América Latina» (https://bit.ly/2RX5EVo)
As
comunas, que são a
unidade básica na qual está
organizada a população, garantem o cumprimento do toque de recolher
e a distribuição de alimentos, baseadas «no conhecimento local e
na
pequena escala das estruturas». Elaboram listas com as famílias que
têm
maior necessidade
de alimentos, produtos de limpeza e medicamentos,
e vão de família em família distribuindo a ajuda, evitando
aglomerações.
Uma forma de organização que facilita a proteção das famílias, já que «os integrantes da comuna não precisam se deslocar além de sua própria vizinhança para distribuir ajuda, diminuindo, assim, o número de pessoas que viajam de cidade em cidade».
Esta ordem comunitária e autônoma é mantida em uma região populada por 4 milhões de pessoas, incluindo cerca de um milhão de refugiados que vivem em tendas de campanha devido à agressão turca. Apesar da organização estrita, do trabalho das cooperativas e comunas, e da solidariedade internacional, os hospitais e centros de saúde tem capacidade para atender só 460 casos ativos de coronavírus.
Um informe do Comitê de Solidariedade com o Kurdistão da Cidade de México destaca que os estados e as organizações internacionais, como a ONU e a OMS, estão atuando de forma irresponsável diante dos contínuos bombardeios da Turquia sobre as aldeias de Rojava, que provocam cortes de água agravando a situação sanitária.
Diante dessa situação, só mesmo a «auto-organização comunitária, ecológica e pacífica» dos povos possui valor no contexto da Administração Autônoma do Norte e Leste da Síria, inspirada no confederalismo democrático teorizado por Abdullah Öcalan, líder kurdo prisioneiro na ilha turca de Imrali.
Em sintonia com a experiência Zapatista e de outros povos latino-americanos, explica o Comité de Solidariedade, eles defendem «uma saúde comunitária baseada antes de mais nada na autonomia, na prevenção social e na educação, além da resistência às medidas estatais repressivas e centralizadoras».
«Voltar à terra e à natureza» é um dos lemas do povo kurdo, que busca enfrentar esta e futuras pandemias repovoando aldeias rurais, reflorestando, promovendo cultivos diversificados com base no trabalho comunitário.
As palavras autodefesa, autonomia e saúde comunitária, ressoam nestes dias tào difíceis, de Rojava até Chiapas, passando por Lima, onde centenas de andinos retornam a seus povoados na serra, sob o lema «Aqui termina Lima», como descreve magnificamentes Rodrigo Montoya (https://bit.ly/3bvGW69). Longe da modernidade urbana individualista, querem refazer suas vidas em comunidades, tecidas com base na reciprocidade e na ajuda mútua.
O
futuro da humanidade está
em jogo nestes
espaços e territórios dos
de
baixo, já
que resistir à
pandemia supõe
colocar em jogo os mesmos recursos com os quais
se resiste ao
Estado e ao capital.
fonte:https://ecuadortoday.media/2020/04/24/autonomias-para-enfrentar-las-pandemias/
https://redlatinasinfronteras.wordpress.com/2020/04/25/autonomias-para-enfrentar-las-pandemias/
fonte:https://ecuadortoday.media/2020/04/24/autonomias-para-enfrentar-las-pandemias/
https://redlatinasinfronteras.wordpress.com/2020/04/25/autonomias-para-enfrentar-las-pandemias/
por Raúl
Zibechi
https://ecuadortoday.media
Tradução: Tacuabe Rebelde
https://ecuadortoday.media
Tradução: Tacuabe Rebelde
Comentários
Postar um comentário